segunda-feira, 16 de junho de 2014

Nascido para Nascer

Tudo começou, há muito tempo, em um centro de reabilitação para viciados. O processo era lento e doloroso para aqueles que tiveram a infelicidade de conhecerem o terrível gosto de serem dominados pelas pulsões mais primárias, seja por drogas, bebida, comida, ninfomania, música ruim...
O método buscado era ressignifcar a vida dessas pobres almas fazendo partos. Isso mesmo, levando todos os pacientes para uma maternidade para que realizassem os partos das futuras mamães. Claro, era um negócio muito amador, não era lá tudo aquilo em termos de qualidade... E tinha vezes que não dava muito certo, e a choradeira era diferente do que esperavam. Eles saíam pela cidade afora 'ajudando' a dar luz, causando tragédias pessoais e separando famílias de montão. Diante das injustiças e horrores da vida, é bom que haja artistas que reaproveitam mil vezes a mesma música, de tal forma que facilite a vida daqueles que a ouvem realizando distraídamente os partos para esquecer seu incapacitante vício em Grey Goose.

Mas então, em pouco tempo, o centro foi assumido por um ex - militar sádico, como se as coisas não pudessem piorar, e ele passou a dirigir o local com um punho de ferro. Ele se determinou a infernizar as terapias de grupo dos parteiros por toda a eternidade, para compensar o fato de que chegava sempre em casa e os filhos reincidentes tinham destruído toda a cozinha dançando funk e ele tinha que ter relações sexuais com Arcângela, que era uma barata gigante que acreditava que era deus e fazia ele engolir um monte de remédios enquanto dormia, o viciando para sempre.

Em mais uma sessão das 10 da manhã, ele passava pela frente deles com seu corpo de gafanhoto, trajando uma roupa criada a partir de toda a pornografia que ele via, que não era pouca. Entre o povo da sessão, estava Abinoã, o tigre que vomitava e que tinha um problema com bebida... Não que ele bebesse todos os dias, não, mas ele era desses que se embebedava com cervejas afrescalhadas de R$ 30,00, ao som de viking metal e bandas que são uma bosta, tipo corvus corax, ou qualquer palhaçada afetada do gênero, para pensar que era um medieval mesmo sendo criado a base de leite com pêra no apartamento da avó. E isso era uma questão de saúde pública.
Além de tudo, ele tinha uma pança recheada de vômito adstringente.

O milico chegou pro Abinoã, e perguntou qual era o nome dele, que por sua vez respondeu que era Abinoã. Ele disse que não aguentava gente chamada Abinoã, pois achava que esse nome pertencia somente a membros da realeza e marujos efeminados, ou membros efeminados da realeza que andam de barco... ele simplesmente não gostava do nome e pronto. E Abinoã começou a rir porque o militar era engraçadão, e ele por sua vez ele protestou dizendo que não tinha nada engraçado para ele ficar rindo que nem um demente, e vendo que ele não iria parar e que sua autoridade estava sendo minada, deu um soco na boca do estômago de Abinoã.

E no dia seguinte começou o treinamento para transformar todos aqueles infelizes em máquinas da obstetrícia! Uma vez ele perguntou: quem era Fulano da Silva. Só um conseguiu responder, dizendo que era o sujeito que entrou numa maternidade e realizou sem consentimento da equipe hospitalar ou das mães o parto de todas elas por cesárea! Muitos prematuros, o que consternou demais as mulheres que já tinham feito mapa astral pros filhos. E depois ele perguntou quem era Zé das Couves, e todos sabiam que eram o cara que fez o parto do filho do Luciano Huck com a Angélica, casal maravilhoso.

E então o treinamento que transformava carne em sangue e vice versa começou. Mas Abinoã era uma negação completa para os exercícios propostos, como esterilizar aparelhos e atleticismos absurdos; ele ficava apenas se perguntando quando poderia descer um rollmops ou uma empadinha absurdamente gordurosa com suas cervejas de metido a entendedor de alguma coisa, que apenas sonegadores de travecos se sujeitariam a beber.

Ele fez apenas um amigo durante toda essa empreitada, chamado Jamel, o único que o ajudaria a poupar sua sanidade. Graças a ele, Abinoã aprendeu a amarrar os cadarços, mas ainda assim era muito ruim no mma proposto pelo militar depois que ele cheirava meias usadas.

E nosso intrépido tigre passou meses sendo denegrido pelo sargentão que descontava os próprios problemas nele, porque ele já foi patético da mesma forma e continuava sendo, para estar relacionado a alguém como Arcângela. Houve uma vez, um dia muito especial, em que todos estavam fazendo um brainstorm de feedbacks de networking de cases de branding de concept para aqueles trocentos milhões de anúncios para toda vez que você pisa num cinema. Haviam monstros de merda por todo o lugar, e depois de bolarem um jingle esperto, o militar descobriu que Abinoã escondia empadinhas repugnantes no seu caixote pornográfico! "Nenhum ser humano decente comeria isso, porra!" - foi a resposta que Abinoã recebeu. O milico disse que ele havia falhado com Abinoã, e com todos eles! E agora todos seriam punidos! Sem dragon age, sem glucagon! E ainda obrigou Abinoã a comer todas as empadinhas acompanhadas daquelas versões diferenciadas da bohemia para trouxas comprarem, enquanto o obrigava a dar opiniões ignorantes sobre assuntos da sociedade e reconhecer que era um beberrão ridículo sustentado pela mãe, sem qualquer amigo, enquanto seus colegas eram forçados a pagar 20. Mil.

Eles ficaram com raivinha, e na noite seguinte eles se pintaram para a balada hipster alternativa, e sorrateiramente se aproximaram do beliche de Abinoã, o imobilizaram com um cobertor, e ficaram contando piadas do patati e patatá! E Abinoã riu tanto que a barriga dele começou a doer, e ele sofreu muito! E Jamel foi cúmplice nessa história toda.

Abinoã parecia realmente ser uma negação para parteiro. Seus questionamentos socráticos não estavam com nada. A única realização dele foi a melhor pontaria com a arma futurista do Iron Maiden (tm) de todos os tempos, o que não era pouca coisa. Mas Jamel achava isso particularmente estranho, pois Abinoã ficava conversando com aquela mesma arma futurista. E a afagando. E fazendo "certas coisas" com ela, enquanto os outros tentavam dormir.

E o militar finalmente reconheceu que Abinoã, afinal, não era um fracasso tão grande assim, e faz a maior festa com guaraná e coxinha, com a música que parecia fadada a sempre parecer que ia começar, e nunca começou uma vez sequer. Todos foram dormir com a barriga estourando de guaraná e risoles roubados, exceto Jamel que estava com uma baita azia. Ele foi no banheiro, e quando viu, lá estava Abinoã, com a arma futurista. "Oi, Jamel..." - disse com um tom um tanto perturbador. "Volta já pra cama! Se o sargento nos pegar, estaremos num universo de bosta! Seremos abduzidos como os filhos dele!" - "JÁ ESTOU... Em um universo... de bosta..." - e assim Abinoã começou a cantar alto pra cacete um rap tunisiano de frutinha, e todos acordaram para verificar a fonte daquela sonzeira sinistra que  falava das virtudes do suplemento. E veio também o gafanhoto militar, em pijama de gafanhoto, inquirindo o que era aquela droga toda do clube do mickey. E então viu que Abinoã estava armado, perigoso, e pelo ângulo parecia mais lagarto que tigre. Perguntou pra Jamel por que ele não tinha desarmado e pipocado Abinoã, e ele respondeu que não havia lhe passado pela cabeça e passou a chorar. O gafanhoto então, com sua retórica de reforma agrária, pediu que ele cedesse a arma agora, a arma que ele cobiçava, e escrevesse um universo fictício que prestasse, digno de um artigo da Wikipedia. Mas Abinoã ignorou, apontando a arma em sua direção, o que lhe fez berrar em fúria impotente: "Qual é seu grande problema, retardado? Acha legal gastar um salário mínimo num bar só com frescurada?!" - E Abinoã atirou em cheio contra o peito dele, e o esterno se arrebentou enquanto o sangue jorrava. Em seguida, ele introduziu a ponta ainda quente da arma na boca, e Jamel gritou: Abinoã, não!
Mas era tarde demais. Abinoã comeu a arma. Ele a levou para a boca, a engoliu e ia demorar pra digerir. Ele era tão inútil e pensava tanto com o estômago que comeu a própria arma.
 

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